Foto: Agência Brasil

O Brasil vive um paradoxo com o custo do trabalho formal tão alto que quase 50% dos trabalhadores estão na informalidade. Isso não acontece por preferência do empresário.

Acontece porque o modelo atual se tornou pesado, burocrático e caro demais para quem gera emprego, especialmente pequenos e médios empregadores. É nesse contexto que avança a proposta de mudança da escala 6×1.

E é importante afirmar que a discussão é necessária. A jornada de 44 horas semanais, em muitos setores, está associada a desgaste, problemas de saúde e queda da qualidade de vida. O debate internacional caminha nessa direção, como já discutido pelo Financial Times e outras revistas de economia.

Mas a questão central não é debater, é como implementar. Porque alterações mal desenhadas podem criar efeitos colaterais graves para o emprego, a economia e até para a previdência social.

Qualquer mudança brusca na jornada aumenta custos diretos e indiretos. Se nada vier na outra ponta para compensar, o resultado pode ser:

  • Menos contratações formais
  • Mais informalidade
  • Aumento do desemprego em setores de baixa margem

Ou seja, o inverso do objetivo de fortalecer o trabalhador. E o impacto final depende de quatro pilares:

  • Transição gradual vs. mudança abrupta: mudanças rápidas desorganizam setores inteiros, comércio, serviços, agroindústria e logística.
  • Incentivos para pequenos e médios empregadores: sem estímulos reais, eles não absorvem o custo adicional.
  • Políticas de redução de custos trabalhistas e tributários: não se amplia proteção social apenas no papel: é preciso desonerar a contratação.
  • Formação profissional e aumento de produtividade: países que reduziram a jornada com sucesso aumentaram produtividade, não apenas redistribuir horas.

A informalidade ameaça também a previdência, e esse é o ponto esquecido no debate
Há um problema ainda maior e pouco discutido: a informalidade crônica está destruindo as bases de financiamento da Previdência Social.

O sistema previdenciário brasileiro é de repartição: os trabalhadores ativos financiam os aposentados. Se metade dos trabalhadores está fora do sistema, e se jovens deixam de contribuir por longos períodos, a conta não fecha.

Hoje, o grande gargalo é justamente esse:

  • faltam jovens contribuindo,
  • as contribuições são intermitentes,
  • e a base ativa não cresce no ritmo necessário para oxigenar o sistema no longo prazo.

Qualquer reforma trabalhista que aumente o custo de contratação, mesmo com boas intenções, pode ampliar a informalidade e agravar ainda mais o problema previdenciário.

Ou seja: sem mais jovens dentro do mercado formal, a Previdência entra em modo de asfixia gradual.

Esse risco precisa ser parte central das discussões, e não um detalhe periférico. A mudança da escala 6×1 merece debate, mas exige cuidado. Sem transição gradual, incentivos reais, desoneração e políticas de produtividade, o país corre o risco de:

  • reduzir o emprego formal,
  • aumentar a informalidade,
  • encarecer o custo das empresas,
  • e fragilizar ainda mais o sistema previdenciário, que depende justamente dos jovens formais para sobreviver.

Reforma trabalhista bem feita protege o trabalhador sem matar o emprego, e ajuda a reconstruir a base da Previdência. Qualquer caminho diferente disso empurra o Brasil para um círculo vicioso: crescimento baixo, informalidade alta e um sistema social que perde fôlego ano após ano.

Miguel Daoud

*Miguel Daoud é comentarista de Economia e Política do Canal Rural


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